Tratamento Endovascular de Aneurisma Cerebral

O que é um Aneurisma Cerebral?

É uma dilatação focal ou segmentar em uma artéria do cérebro devido à um defeito ou fragilidade localizado de uma porção da parede do vaso sanguíneo. A causa para a fragilidade localizada da parede arterial pode ser genética e estudos de necrópsia mostraram que em aproximadamente 5% da população é portadora de um aneurisma cerebral. O aneurisma se forma devido pressão sanguínea que atua como um constante martelo de água que ao pressionar a parede enfraquecida da artéria se forma uma dilatação que cresce como uma bolha podendo romper causando uma hemorragia cerebral. Outros fatores que estão associados com aneurismas cerebrais são a aterosclerose, história familiar de aneurisma, tabagismo, hipertensão arterial, rins policísticos e doenças do tecido conjuntivo.

O indivíduo portador de um aneurisma cerebral corre o risco de, ao longo de sua vida, ter uma hemorragia cerebral devido ao rompimento do mesmo. Apesar de a possibilidade de ruptura (hemorragia) de um aneurisma ser baixa, em torno de 1% ao ano, ela aumenta de acordo com algumas características do mesmo onde o tamanho parece ser o fator mais importante. As consequências do sangramento são muito graves e a idade média da ruptura de um aneurisma é de 50 anos. Após a ruptura, se não tratado, a possibilidade de um novo sangramento é muito alta e geralmente fatal.

O tipo de hemorragia causada por um aneurisma é chamado de hemorragia subaracnoide (HSA) que é um quadro clínico extremamente grave resultando na morte em 30% a 40% dos casos antes de chegar a um hospital. Mesmo entre aqueles que sobreviverem ao primeiro sangramento, quase 50% sofrerão de algum grau de sequela neurológica.

Tipos de aneurismas cerebrais

Existem diferentes tipos de aneurismas e são classificados de acordo com seu formato, tamanho, localização e causa. 

O tipo mais comum é o chamado de sacular e classicamente é uma bolsa na parede da artéria. O segundo tipo é o fusiforme em que existe o crescimento difuso de toda a parede da artéria.

Sintomas

O rompimento do aneurisma é a apresentação clínica mais grave sendo descrita pelos pacientes como a “pior cefaleia” (dor de cabeça) já sentida na vida. Alguns pacientes relatam que tiveram um episódio de cefaleia de menor intensidade algumas semanas antes do rompimento do aneurisma o que é chamado de cefaleia de aviso. Após o rompimento poderá se seguir um quadro clínico variado de náuseas, vômito, confusão mental e coma nos casos mais graves. Outros sintomas que podem ocorrer isoladamente ou acompanhar a cefaleia são: dilatação da pupila em um olho, dificuldade visual e dor com rigidez da nuca. Além de romperem causando hemorragia cerebral, aneurismas cerebrais podem, na medida que crescem, comprimir estruturas cerebrais como nervos ou obstruindo outras artérias causando dificuldade de passagem do sangue e ocasionar isquemia.

Eventos pós-sangramento de um aneurisma

Diagnóstico do aneurisma cerebral:
Após a avaliação clínica e a realização em alguns casos de uma punção lombar para pesquisa de sangue no líquido céfalo raquídeo todos os pacientes devem realizar uma angiografia cerebral. Uma angiografia cerebral é o estudo do sistema vascular do cérebro e pode ser de três tipos:

  • Angiografia por cateter: É o método chamado padrão ouro porque é a visão direta da luz do vaso. Um tubo plástico (cateter) é introduzido geralmente por via femural e guiado por raios X para as artérias que nutrem o cérebro (carótidas e vertebrais). Após o posicionamento do cateter é injetado um meio de contraste que se mistura com o sangue e realizado um filme das artérias e veias do cérebro que demonstra a existência ou não do aneurisma ou outras anormalidades vasculares;
  • Angiografia por tomografia computatorizada (Angio-TC): é realizada em tomógrafos de multi-detectores após processamento e reconstrução de imagens tomográficas;
  • Angiografia por Ressonância Magnética (Angio-RM): realiza exames sem uso de RX e pode ou não utilizar contraste (gadolínio). É utilizado para pesquisa em pacientes de baixo risco (ex: história de aneurisma na família) devido à pouca invasividade do método.

Tipos de Tratamento

Independentemente do tipo de abordagem escolhida (cirúrgica convencional ou endovascular) para um dado aneurisma, o paciente deve estar em um ambiente onde exista a possibilidade de intercâmbio de ambas especialidades assim como de cuidados clínicos específicos principalmente no que se refere à aneurismas rotos. O momento do tratamento de um aneurisma cerebral depende basicamente na forma de apresentação clínica. Quando um aneurisma é encontrado de forma incidental (não houve ruptura) a conduta será guiada principalmente pelo tamanho do mesmo. Aneurismas de 3mm a 7 mm podem ser seguidos com controles por angiografia a cada ano. Aqueles aneurismas acima de 7 mm dependendo da localização poderão ser tratados preventivamente por meio de cirurgia convencional ou métodos endovasculares.
A ruptura de um aneurisma cerebral é uma emergência médica e aqueles pacientes que chegam com vida à um hospital devem, se possível, serem tratados de forma que rápida para que não ocorra o ressangramento que é fatal na maioria dos casos.

Tratamento cirúrgico convencional: A cirurgia convencional é realizada há mais de 40 anos e foi a única alternativa de tratamento até o início da década de 1990. A cirurgia convencional é realizada até o terceiro dia após o sangramento e depois do décimo dia. Consiste na abertura do crânio (craniotomia) através da qual são introduzidos instrumentos cirúrgicos. A seguir é realizado, de forma delicada, o afastamento do tecido cerebral e exposto o aneurisma. O próximo passo é a clipagem do colo do aneurisma impedindo que o fluxo sanguíneo cause o rompimento e uma hemorragia. Em aneurismas rotos (que romperam) a cirurgia convencional é realizada até o 3º dia após o sangramento e depois do 10º dia evitando o período intermediário (4º – 10º dia) em que o vasoespasmo e o edema cerebral está instalado.

Tratamento Endovascular: O tratamento endovascular por embolização é realizado há 20 anos.O objetivo do tratamento endovascular é o isolamento do aneurisma da circulação sanguínea sem a necessidade de abertura do crânio. O tratamento endovascular é realizado por intermédio de cateteres que são introduzidos remotamente (à distância) no sistema vascular. Para isto um cateter é inserido na artéria femural por uma pequena incisão (corte) sendo guiado por um sistema de RX para o interior do aneurisma a ser tratado. Após o cateter estar posicionado dentro do saco aneurismático são introduzidos espirais de platina (micro-molas) de diversos tamanhos que preenchem o interior do aneurisma causando a trombose (coagulação) do mesmo.

Este procedimento é chamado de embolização e sua eficácia e superioridade sobre a cirurgia, naqueles aneurismas em que ambos tipos de tratamento é possível, foi demonstrado no estudo ISAT. Atualmente ,devido a este estudo (ISAT) em torno de 70 a 90% dos aneurismas na Europa são tratados por via endovascular sem a necessidade de abertura do crânio.

Nos pacientes que se apresentam com HSA (hemorragia subaracnoide) a incidência de vasoespasmo e sua consequente isquemia e déficit neurológico também é menor no tratamento endovascular quando comparado ao tratamento convencional por craniotomia e clipagem segundo estudos científicos. Atualmente com a possibilidade de injeção concomitante de drogas a possibilidade de vasoespasmo é ainda menor com o tratamento endovascular segundo o estudo CONSCIOUS. Uma análise neuropsicológica de pacientes do estudo ISAT demonstrou que os submetidos à embolização endovascular apresentaram menores déficits na área cognitiva.

Outra vantagem do tratamento endovascular por embolização é que independe do momento. Pacientes tratados por cirurgia convencional entre os dias 4 e 10 pós-sangramento tem piores resultados do que aqueles tratados até o 3º dia ou depois do 14º dia. Isto se deve devido ao vasoespasmo e edema cerebral resultante da hemorragia que torna a cirurgia mais delicada. A espera pelo melhor momento da cirurgia (depois do 10º dia) pode acarretar em novo sangramento.

De uma forma geral todo o aneurisma em que a geometria do mesmo é favorável (relação colo/fundo) este é passível de tratamento por embolização. Nos casos em que esta relação é desfavorável para o uso simples de espirais existe ainda a possibilidade do uso de stents ou de diversores de fluxo (flow-diverters).

Stents consistem uma malha tubular que reconstrói a parede arterial não permitindo que as espirais escapem do interior do saco aneurismático. Atualmente também existem uma segunda geração de stents chamados de “flow-diverters” (desviador de fluxo) que consistem em stents com uma malha muito fina que tem a função de reordenar o fluxo sanguíneo na região do colo do aneurisma podendo muitas vezes serem utilizados como tratamento único.

Em resumo a conclusão dos estudos ISUIA e ISAT é de que quando a anatomia é favorável, o tratamento endovascular é a melhor opção, especialmente em pacientes com mais de 50 anos, aneurismas não rotos (descobertos por acaso em exames de imagem) e aneurismas da circulação posterior.

Literatura científica para consultar:

1. Analysis of treatment by Endovascular Approach of Nonruptured Aneurysms (ATENA study ). AJNR 2010 Jan;31(1):140-144.
2. Curative Cerebrovascular Recontruction with the Pipeline Embolization Aneurysm. J Neurointerventional Suurg 2009;1:55-56.
3. Long-Term Follow-up of 1036 Cerebral Aneurysms Treated by Bare Coils: A Multicentric Cohort Treated between 1998 and 2003. AJNR 2009 Nov;30(10):1986-92.
4. Endovascular Treatment or Neurosurgical Clipping of Ruptured Intracranial Aneurysms – Effect on angiographic Vasoespasm, Delayed Ischemic Neurological Deficit, Cerebral Infarction, and Clinical Outcome. Stroke 2010;41:2519-2524.
5. Improved Cognitive Outcomes with Endovascular Coiling of Ruptured Intracranial Aneurysms. Stroke, 2010;41:1743-1747.
6. International Subarachnoid Aneurysm Trial of neurosurgical clipping or endovascular coiling in 2143 patients with ruptured intracranial aneurysms: a randomised comparinsonof effects on survival, dependency, seizures, rebleeding, subgroups, and aneurysm occlusion. Lancet 2005;366:809-817.

© Dr. Eduardo F. Raupp
Tratamento Endovascular de Doenças Vasculares Cerebrais